Cartas ao Leitor 8: Monólogo interior, último recurso

No feriado de Páscoa estava lendo Albert Cohen, autor que poucos lembram, que está fora do cânone, ausente dos grandes cursos de literatura mas que é rigorosamente genial e grande no que fez. Estava lendo meu velho volume de La Belle du Seigneur, um calhamaço de mil páginas que conta uma história hiper simples e que envolve apenas três personagens. O livro, no entanto, se torna gigantesco por seu estilo, pela beleza da criação literária, inventiva e lírica e, também, pela ousadia narrativa.

Um elemento, dentre muitos, chama atenção: o recurso do monólogo interior, o dispositivo consagrado por James Joyce no seu Ulysses – mas que já estava presente no estilo indireto livre de Dostoievsky e que aparece em outros autores, em graus diferentes de inventividade.

Sim, o recurso marcado pela noção de fluxo da consciência, com uma economia catártica de pontuação, frases se sobrepondo a frases – a dita literatura moderna, por excelência.

Em Albert Cohen vemos uma interessante variação desse estilo: primeiramente, nota-se que não há a abundância de interjeições, de pontos de exclamação e de interrogação que vemos em Joyce e nem, tampouco, aquele diálogo ensimesmado, sempre centrado no conflito moral-ideológico, que vemos em Dostoievsky.

Temos outra coisa, inclusive difícil de dizer o que é. Mesmo porque, só nesse romance há uns dez monólogos interiores, todos diferentes entre si. O dos personagens Solal e Ariane são os principais. E é incrível a diferença ente eles: no monólogo interior de Solal, tem-se uma tônica argumentativa curiosa, que traduz o espírito cartesiano em suas agruras, em seus subterrâneos. No de Ariane, tem-se uma impressionante textura de sensualidade, centrada na observação do quotidiano e no desejo de transcendência.

Belo livro o de Cohen. A leitura foi interrompida pelo início da semana de trabalho: aulas, orientações, pareceres, reuniões, bancas, artigos… e nem tudo isso interessante E eis-me aqui pensando em como seria um monólogo interior dos meus afazeres na universidade… Evidentemente não vou atormentar vocês com essa chateação – mas pensar nisso e fundir os diferentes estares e tempos do meu trabalho me pareceu um recurso interessante para não sair do ambiente literário… um último recurso…

Boa semana a vocês.

Cartas ao Leitor 7: A indevida apropriação da “alma russa” pela propaganda de guerra

Por todo lado se tem evocado a “alma russa” para explicar a invasão da Ucrânia. Sem desmerecer as lições da literatura, creio, no entanto, que a geopolítica seria mais interessante para essa explicação – notadamente a compreensão de que, por mais injustificável que seja a invasão da Ucrânia, os Estados Unidos, se servindo da Otan e manipulando o fraco governo ucraniano, efetivamente cancelou todas as saídas diplomáticas possíveis.

Certo, a “alma russa” está presente aí, também. Mas não a “alma russa” cruel e totalitária que desejam fazer valer, nestas horas de russofobia, e sim a “alma russa” calejada por um espírito de proteção e de resistência diante da insistência, tanto do Ocidente como do Oriente, de ameaçar sua soberania – por exemplo, a invasão da Rússia ou da URSS pela Suécia, pela Polônia, pela França, pela Alemanha por duas vezes e pelo Japão, ao longo dos últimos 300 anos.

Muita coisa me deixa indignado nessa história. Primeiramente, claro, a invasão Muita coisa me deixa indignado nessa história. A invasão da Ucrânia pela Rússia, claro. Mas, tanto quanto ela, a russofobia, essa guerra de enunciados, essa manipulação de ódios e seus efeitos econômicos e, é preciso dizer, o jogo político dos EUA/Otan de ir pressionando a Rússia até a guerra, talvez apenas para poder impor as tais sanções econômicas.

E, particularmente, dentro da manipulação russofóbica em curso, me indigna, particularmente, o tal discurso sobre a “alma russa”, revestido do mais puro funcionalismo, sobretudo quando utilizam Dostoiévsky para explcicitá-lo.

E por que usam Dostoiévsky? Ora, porque Dostoiévsky desenvolve personagens que surgem das entranhas mais miseráveis da vida para cometer toda sorte de crimes, mesuinharias e pecados.

Usando Dostoiévsky para falar da tal “alma russa” sugerem que toda a Rússia, todo o povo russo, procede tal como os seus personagens. Sugerem que a violência presente no submundo retratado por seus romances constitui a essência e mesmo a totalidade do que seria o povo russo, o que é um grande absurdo.

E o pior é que essa confusão, essa narrativa propositadamente errônea, está sendo repetida por todo lado, à exaustão, dia após dia, no jornalismo e emissões literárias, redes sociais, muito particularmente na programação da Radio France Culture mas em todos os grandes veículos de comunicação do dito “Ocidente”.

Bem entendido que não estou aqui para justificar uma invasão militar, mas para defender o bom senso e o respeito pela verdade. E cabe dizer que, se uma “alma russa” existe, ela com certeza não tem nada a ver com o espírito bélico. Antes, deveria ser buscada na religiosidade ortodoxa, centrada numa peculiar ideia de salvação e na longa história eslava, com todas as suas experiências de defesa ante a violência de conquista, vindas dos imperialismos da Ásia, Europa e América do Norte.

Cartas ao Leitor 6: Kharkhov-casa, Odessa-mundo, exílio e literatura

A guerra da Ucrânia se processa – também – literariamente. Inclusive porque a literatura preserva a ponderabilidade, os valores, a alma dos lugares e, sobretudo, denuncia das mentias e ilusões. Kharkhov, bombardeada nos últimos dias, foi descrita, dentre outros, por Émmanuel Lévinas. Ele a conheceu no caminho do êxodo que o levou, a ela e a sua família, da Lituânia até a França. Kharkhov. Cidade muitas vezes referida em Totalité et Infini (1961). Lévinas imagina se fosse lá a sua casa. E casa, em Lévinas, significa muito mais que uma construção: “O papel privilegiado de uma casa não consiste em ser o fim da atividade humana, mas em ser a própria condição humana”.

O exílio é sem casa. O exílio sonha em recuperar a casa. Em ser-casa.

Cabendo considerar que “casa” significa, para Lévinas, ter lugar em um lugar, ser-lugar. Estar abrigado. Sonho dos exilados – como eu, inclusive, que nunca soube nem se tenho lugar na cidade em que habito.

Mas casa, para Lévinas, também significa abrigo, proteção.

A partir da sua casa”, assim compreendida, como abrigo, diz o filósofo, “o ser rompe com sua existência natural”.

Sim, toda casa uma ruptura, uma separação. Toda casa, quando abriga, quando protege, possui, fenomenologicamente, essa dupla condição: a de ser o vínculo com o lugar e a de ser ruptura com o lugar. A de ser de portas abertas e a de ser de portas fechadas.

Entre as paredes da casa se organiza o “recueillement” de consciência de que fala Lévinas: “porque o Eu existe quando se recolhe, quando se refugia entre as paredes de uma casa, de um abrigo”. E mais explica meu amigo Lévinas, dizendo que isso se dá porque “O homem se percebe no mundo como alguém que existe no ato de se recolher, no ato de se refugiar, empiricamente, em uma casa”.

O homem sempre está no mundo fazendo um movimento, sempre igual, de recolhimento, de retorno ao seu abrigo, a sua casa.

Estar abrigado tanto significa participar do lugar como se proteger do lugar.

E há lugares dos quais precisamos nos proteger. Belém, por exemplo, tal como Karkhov, a julgar pela etnografia fenomenológica que Lévinas fez dessa cidade.

Mas não Odessa, outra cidade ucraniana tristemente bombardeada por estes dias.

Certo, temos certo conhecimento geral sobre Odessa, mas não sobre Kharkhov – ou Carcóvia, em velho português. Odessa está no cinema e nos livros de história, mas Kharkhov, apesar de toda a sua história, é pouco notada e lembrada.

Kharkhov é casa, Odessa é mundo.

Kharkhov, que conheço de tanto que Lévinas falou sobre ela, tem, igualmente, muito passado. Kharkhov é a alma da Slobodskaya, região que se divide entre Ucrânia e Rússia, um pouco parecida com as cidades históricas de Minas Gerais, se for preciso encontrar um símile. Lugar cheio de passado, de história, de invenções linguísticas, de identidade, de segredos de família.

Ah, e Kharkhov também foi o centro, o núcleo efervescente da Associação Russa de Escritores Proletários, instituição fortíssima, que produziu conceitos que definiram o que era a literatura soviética, em seu tempo. Não é sem razão, portanto, que o maior museu de Kharkhov é o Museu da Literatura. O Único museu, no mundo inteiro, consagrado à literatura.

Ao contrário de Kharkhov, Odessa é mundo mais do que casa. Odessa é exterior, é uma dessas cidades públicas, com calçadas abrigadas da chuva, colunadas, avenidas cheias de árvores, imensos prédios públicos. Odesse é uma dessas cidades acaloradas, vivazes, cheias de vida. Uma cidade cheia de fantasia e de imaginação. Como Belém, por sinal.

Odessa é sua escadaria, retratada no Encouraçado Pontenkin, de Eisenstein, o primeiro grande filme da história, filmado em 1925.

Nestes dias tristes de guerra, quando Kharkhov-casa e Odessa-lugar vão sendo consumidos, vou, devagar, pensando na descrição que Políbio fez da história de Cipião Emiliano, encarregado por Roma de, naquele distante-próximo ano de 146, lamentando profundamente a sua missão mas executando-a, como bom soldado que era, destruir Cartago: delenda est… diziam e dizem…

Emmanuel Levinas – 

Cartas ao Leitor 5

Bom dia,

E bem-vindxs ao tempo que os alunos não têm o que dizer. Para nós, professores, é o mal constante das gerações recentes: perguntamos se alguém têm comentários ou questões e somos açoitados por um lancinante silêncio. Claro que há exceções (raras) e que me refiro mais à graduação, porque no mestrado e doutorado as pessoas falam mais – talvez com a excessão dos que vêm diretamente da graduação, e, assim, dessa cultura tartamuda.

Distantes tempos em que se alugava o professor com perguntas e que, do ponto de vista dos alunos, era um triunfo quando se conseguia construir um argumento que mobilizava toda a sala de aula. Distantes tempos em que se escrevia dez páginas (alguns vinte) para cada resposta na prova, quando o limite era de três páginas para a resposta. Ou em que a gente, quando era aluno, trazia nossas leituras de fora do programa para “dialetizar” a aula. Meus tempos… e nem tão distantes assim.

Lamento, mas, de boa, tanto faz: se é assim que é, se é assim que eles precisam que seja, fazemos o melhor, certo? Claro, e sigo corrigindo as provas dos meus alunos, neste semestre. É a semana do ano dedicada a isso: corrigir provas e auferir conceitos.

Mas deixei 30% da avaliação para pontuá-los por sua participação em aula. E ela não houve. Ninguém teve dúvida, dúvida de verdade. Pontualmente, uns não entenderam um detalhe, um detalhezinho, porque eles entendem geralmente tudo. Pontualmente, eles comentaram algo, e creio que todas as vezes foi a partir de uma experiência própria e intuitiva, do tipo “eu sinto que”. Apesar da farta bibliografia disponibilizada, só leram o que eu mandei ler: não há mais o conceito de autonomia de pesquisa, de curiosidade, de vontade de saber.

Bem-vindos ao um mundo em que os alunos, além de não falarem, lêem superficialmente, quando lêem. E que lêem o que lhes é imposto.

Sigo tentando compreender esse mundo estranho, mas não há sociologias que me o expliquem. Há confabulistas, que dizem que isso se deve à internet e a uma cultura que mistura superficialidade com fragilidade na nova geração. Pode ser, mas as pesquisas que dizem isso são também superficiais. Há que considerar a extrema vulnerabilidade psicológicas das gerações mais recentes. Mas a que isso se deve? E eu gostaria muito de entender o que está acontecendo, porque sem entender não tenho como ajudar, ou adaptar meu trabalho para que ele funcione melhor.

De qualquer forma, é preciso sobreviver a esse estranho mundo. Nunca foi tão cansativo ser professor, mas é preciso sobreviver. Aqui e ali vamos experimentando para ver se eles ficam mais estimulados, independentes, seguros, interessados. Aqui e ali… pontualmente.

Cartas ao leitor 4: Papo-furado e marcadores ilocucionais da identidade

Carxs, bom dia e boa semana!

Quando nós morávamos na França e eu ia buscar o Pedro na escola (menos às quartas-feiras), participava alegremente – e com um curiosidade antropológica que não devia estar preenchendo os espíritos próximos – dos rituais de cumprimento comuns entre os pais: bonjours, comentários generalistas sobre o clima, referências superficiais ao estado de conservação do lugar e indicativos vagos como « lá vêm eles ! », « está na hora ! » ou « os exames estão chegando ! ».

Tudo muito vago e superficial. Não era questão, jamais, de falar de política, de um filme ou de nosso estado espírito.

Praticávamos todos uma retórica vaga, a enunciação de frases prontas que sequer demandavam, realmente, uma resposta. Détours rhétoriques

Comecei a perceber que havia muito mais em torno daquele papo-furado. Nenhum papo-furado é, realmente, anódino e impune. Eles cumprem uma função social maior, de agregação, de marcação da identidade, de produção do ritmo social da vida em comum. Dizer que o clima estava frio, ou quente, ou lembrar que “está quase na hora” da saída das crianças não eram, unicamente, frases vazias que preenchiam o tempo. Eram muito mais: eram pactuações cortezes da existência em comum. Era entrar em comunidade. Era confirmar que partilhávamos uma experiência.

Mais tarde, percebi que esse papo-furado está presente em todo lugar (embora não em todos os lugares…) e que é uma parte vital da nossa vida social, provavelmente em todas as culturas e linguagens.

Isso tem a ver com Heidegger e com sua tese sobre a ek-sistência, precisamente a percepção de que não há Dasein (Ser-aí) sem Mitsein (ser-com-outros), inclusive (ou sobretudo) na vida quotidiana e banal, onde o estar-junto num horizonte possivelmente comum (o milieu, como dizem os franceses) se projeta em permanpencia: um lançar-se fora de si que precisa ser, o tempo todo, ensaiado, testado, repactuado.

E isso lembra também o filósofo japones Tetsurō Watsuji, primeiro grande leitor de Heidegger no Japão (e muitos se sucederam) que, inclusive, começou o seu grande livro Fûdo, de 1935, falandi sobre a banalidade da partilha da experiência climática do frio. Watsuji elabora um elogio da experiência banal e do diálogo banalizado: seriam eles, diz, vitais para a existência social, porque procedem sem nenhum olhar sobre o estado psicológico e profundo do interlocutor – exigido na conversação mais séria ou objetiva.

Pensando nessas coisas, me ocorreu lembrar o quanto é importante o quotidiano e, nele, o dizer-por-dizer, o falar-por-falar, o estar-por-estar, o ser-por-ser. O quanto é vital estar no mundo sem pulsões de consequencialidade.

É a partir dessa percepção que, o tempo todo, escapo dos grandes saberes, dos triunfos inter-pares da vã Academia, das teorias do discurso e das hierarquias determinativas do ser. E por quê estou dizendo tudo isso. Ora, porque já se passaram estes dias de festa e de estar à toa e à feliz mercê da imperfeição do mundo e, portanto, estamos recomeçando a lida na selva dos sentidos perfeitos, onde dizer “Bom dia” ou “Está quente, hoje, hein,” é, também, uma simples e “perfeita” ilocução…

Cartas ao leitor 3: Tratar-se com Sêneca em tempos dostoievskianos

Pueblo de mi comunidad,

Afetos a todos e todas,

Ahahah, começo rindo, mas um pouco alarmado. Avança a ameaça Omicron, certo, e eu aqui, novamente com Covid, pensando na febre de Petrov. Pior: rindo quando lembro de Dostoievski. Sinal de tempos estranhos: quem pode rir, quando lembra de Dostoievski? Quem pode rir, tomado pela Covid? É minha segunda contaminação, mas felizmente as três doses da vacina, que já tomei, a tornam rarefeita. Padeço menos e depois de quadro dias os males começam a partir. Sobra o estranho mundo.

Sim, o mundo anda muito estranho; inclusive eu, que estou dentro dele, ando estranho. Provavelmente não se ri do mundo, nestas circunstâncias. Provavelmente. O que confirma que continuamos estranhos, dentro de tempos estranhos.

É que vi, por estes dias, o filme A febre de Petrov, do cineasta russo Kirill Serebrennikov. Um filme que fala de pandemias. Não da Covid 19, até porque ele foi feito há uns 20 anos.

Adaptado de um romance de Alexeï Salnikov, conta a história de uma homem doente e solitário que se trata com… vodka. Sim, a bebida que não tem gosto e que, como se diz, é a bebida ideal para quem não gosta de beber.

E isso tem a ver com Dostoievski. Tudo remete a Fiodor Dostô, tanto nesse filme como nestes tempos estranhos – cabendo lembrar que, em 2021 celebraram-se os 200 anos de seu nascimento.

Tal como nas obras de Dostô, há medo, desilusão, nervosismo, falta de ar e o entrever da canalhice humana.

Vivemos tempos incertos e dostoievisqueanos. E é nervoso esse riso que ri de nossos tempos.

Como todas as vezes em que li Dostô precisei de uma dose de Sêneca (pois nenhuma vodka seria suficiente para resolver essas coisas), desta vez, outra vez, corri para o meu amado Sêneca, mestre das minhas incertezas existenciais.

Façamos silêncio, com Sêneca. E vamos, até mesmo, parar de rir.

Sim, é difícil. Como avisa o filósofo, nenhum silêncio se conquista com luta, seja porque o universo é ruidoso, seja porque nós, humanos seres, tendemos a ser mais ruidosos até mesmo que o universo. Segundo Sêneca, o barulho está na nossa natureza mais profunda.

Sigamos seus conselhos e vamos, primeiramente, escutar o silêncio que habita a nossa profundidade. Silêncio não é não dizer, é ouvir o outro e ouvir em paz o barulho do mundo.

Em seguida, aprendamos a impor, sem nenhuma violência, o silêncio aos outros. Por mais que isso seja difícil na cidade de Belém, que se bate e se agita na pulsão natural do universo… Por mais que isso seja difícil no Brasil de Bolsonaro, que quer não escutar o outro e nem o universo…

Desistamos…

Somos seres contraditórios. Para nós, a literatura é por vezes silêncio; e, por vezes, ruído….

Boa semana a todxs.

Cartas ao Leitor 2

Queridxs, bom dia e boa semana,

A vantagem da Covid, se alguma há, é a de nos trazer um pouco o grego. O idioma, não Zorba, ou qualquer outro, bem entendido. Ômicron, quando estudei grego, era O, micron. O ó curto, pequeno, ladino.

No que tange à pandemia, é O preocupante, e não, portanto, tão micron assim. É macron, ou mega, efetivamente. Mas continuemos. Continuemos para além da covidologia. Não percebemos de quantas mais letras gregas teremos de nos defender, mas deixemos que venham, que estaremos aqui para o que for possível, vacinados, com máscara, com ácool 90% e com o distanciamento social necessário. Sim, e desmentindo o genocida canalha, sempre que necessário.

Mas à propósito da escolha da letra O para falar da doença, permitam, apenas, que eu mencione o fato de que haveria de transtornar os gregos antigos: O, para eles, era o símbolo da eternidade, de algo que não acaba nunca… Na Alexandria helenista e sapientíssima até as pedras de rua do Rakhotis, o bairro popular da velha cidade, sabiam que não se devia usar a letra O junto de coisa ruim.

Gloups… Péssimo nome para uma variante da Covid… Alguém devia ensinar grego antigo à OMS e um pouco de cultura helênica à comunidade científica internacional.

Mas enquanto não fazem isso, fiquemos com o anedotário convencional.

No blog, esta semana, agendei, além desta Carta, a segunda crônica da série « O viajante literário em Londres ». Nela, visitaremos os endereços de Samuel Taylor Coleridge e de John Keats, dois grandes poetas. Essa crônica sai na quarta-feira a noite. Antes dela, amanhã, sai um texto sobre duas jornalistas americanas recentemente falecidas, Eve Batiz e Joan Didion, personagens influentes do jornalismo cultural das últimas décadas. Já na sexta-feira publico um resenha sobre… bom, se antecipar pode perder a graça.

Boa semana a todos e a todas.

Cartas ao Leitor 1: 2022

Queridos, bom dia e feliz ano novo. Feliz 2022! Saúde e coragem!

Inicio este blog num ano de luta e acreditando que literatura, cultura e política são a mesma coisa quando se trata de disputar um projeto de mundo. Também acredito que projetos de mundo são obras coletivas e que, em torno deles – e delas – não andamos sós.

Entramos em 2022 num sábado, simbolicamente o último dia da semana, o que, imagino, possa sugerir que é também o último ano de um ciclo. E que, portanto, 2023, será um grande ano.

Enquanto ele não chega, nos viremos com 2022. Ano de luta, ano da conquista de 2023. Não será fácil. Mas é o ano do Tigre, no horóscopo chinês. Apeguemo-nos a isso, para lutar contra a ignorância, contra o bolsonarismo e em favor de Lula Presidente. Lula se tornou um projeto racional e de salvação nacional. Se não for ele, continuaremos afundando, com quilos de chumbo nos pés, senão mesmo nas costas.

Será um ano, também, de debate ambiental – felizmente. Ano das ciências básicas para o desenvolvimento sustentável e ano do desenvolvimento sustentável dos biomas montanheses, segundo a ONU. Ah, e, ainda segundo a ONU, ano internacional da pesca e da agricultura sustentáveis. Pensemos nisso.

Nos calendários paralelos entraremos no ano 4.720 no calendário chinês, 5.783 do calendário hebraico, 1.944 do calendário hindu, ano 1.444 do calendário mulçumano, ano 1.401 do calendário persa e no ano 231 do calendário revolucionário francês.

O ano é cheio de efemérides que valem à pena ser lembradas:

No dia 1° de janeiro comemoramos os 300 anos da aparição do 1° jornal latino-americano, a Gaceta de México.

No dia 15 de janero festejamos os 400 anos de nascimento de Molière.

No dia 17 de janeiro, celebramos os 20 anos de partida de Camilo José Cella, prêmio Nobel de literatura.

No dia 7 de fevereiro relembramos os 210 anos do nascimento do escritor Charles Dickens.

No dia 11 de fevereiro relembramos o centenário da Semana de Arte Moderna brasileira.

No dia 16 de março festejamos os 130 anos de nascimento do poeta César Vallejo.

No dia 2 de maio, também festejamos os 250 anos de nascimento do poeta Novalis.

Ainda em maio, no dia 18, estaremos nos 150 anos de nascimento de Bertrand Russel, Nobel de literatura.

A 6 de julho, celebramos os 60 anos de partida de William Falkner.

A 29 de setembro, os 120 anos de partida de Émile Zola.

A 21 de outubro, comemoraremos os 40 anos de recebimento do Nobel de literatura por Gabriel García Márquez e, no mesmo dia, os 250 de nascimento po poeta Samuel Taylor Coleridge.

A 16 de novembro, celebramos o centenário de nascimento de José Saramago, igualmente Nobel de literatura.

2022 refere outras datas políticas: logo no 1° de janeiro, 20 anos da entrada em circulação do Euro (e eu vi isso…). A 7 de fevereiro, os 30 anos da criação da União Europeia. A 8 de março os 105 anos de Revolução Russa.

Será ainda um ano de grandes lutas políticas: em janeiro, eleições legislativas em Portugal e presidenciais na Itália. A 10 de abril, 1° turno das presidenciais na França. A 29 de maio, presidenciais na Colômbia. A 2 de outubro, eleições gerais no Brasil.

Para completar, preciso referir que neste ano entram em domínio público os livros, filmes e músicas lançados em 1926 nos Estados Unidos. É pouco e todos nós queríamos mais, mas dizê-lo faz pensar que precisamos lutar por um domínio público mais racional, equitativo, ponderado e, sobretudo, que melhor aproxime público e obra.

Criei este blog para estar de outro modo com vocês, ou para estar melhor com vocês. A ideia é falar com minha voz literária, ou com o que quer que isso signifique. Sigamos juntos.