
Aqui a carne da memória sussurra histórias e nos instrui: não há leituras secundárias. Incursionamos por países secretos, atravessamos pequenas almas na pátria dos exilados, num recontar de quando se nasce com toda a história já decidida e a vida demanda reescritura.
A lenda é de um réptil, que vai por dentro – na azulejaria, em poços ou espelhos. Predestinado a olhar, nos confronta com a moral familiar, os simbolismos, as muralhas do espírito. Chega-se ao Anfão e ao velho Malaquias; ao Felipe à procura de João; ) mãe presa e torturada; à avó lembradora; aos homens crescendo em cidades (aladas) que não são suas. Recordações centrífugas e centrípetas. E sussurros: Miguel e cães invisíveis, serpentes icéfalas, lêlures vermelhas. O réptil vaticina que se mora tanto em casas quanto em pensamentos.
Crônicos paradoxos. Lisboa e a Revolução dos Cravos; Paris, pátria superposta; e o que pode ser o Brasil (uma pergunta?). O Estado cínico, as causas ganhas/perdidas, o nunca acontecido. A pragmática da colônia eterna. Utopias cruas. Abraços que garantem o consentimento para se ter um passado. Modo de se fazer: demolir os lugares da memória? Ser uma história-que-não-foi? E: qual é sua origem?
O réptil se completa na prática do jogo. Sem busca, desaparecerá, será silenciado, ou se transformará num homem arrogante em ternos brancos. Pois jogue. Este O réptil melancólico nos enseja um mundo de percepções inegavelmente corajosas e necessárias.
Luci Collin