
Pueblo de mi comunidad,
Afetos a todos e todas,
Ahahah, começo rindo, mas um pouco alarmado. Avança a ameaça Omicron, certo, e eu aqui, novamente com Covid, pensando na febre de Petrov. Pior: rindo quando lembro de Dostoievski. Sinal de tempos estranhos: quem pode rir, quando lembra de Dostoievski? Quem pode rir, tomado pela Covid? É minha segunda contaminação, mas felizmente as três doses da vacina, que já tomei, a tornam rarefeita. Padeço menos e depois de quadro dias os males começam a partir. Sobra o estranho mundo.
Sim, o mundo anda muito estranho; inclusive eu, que estou dentro dele, ando estranho. Provavelmente não se ri do mundo, nestas circunstâncias. Provavelmente. O que confirma que continuamos estranhos, dentro de tempos estranhos.
É que vi, por estes dias, o filme A febre de Petrov, do cineasta russo Kirill Serebrennikov. Um filme que fala de pandemias. Não da Covid 19, até porque ele foi feito há uns 20 anos.
Adaptado de um romance de Alexeï Salnikov, conta a história de uma homem doente e solitário que se trata com… vodka. Sim, a bebida que não tem gosto e que, como se diz, é a bebida ideal para quem não gosta de beber.
E isso tem a ver com Dostoievski. Tudo remete a Fiodor Dostô, tanto nesse filme como nestes tempos estranhos – cabendo lembrar que, em 2021 celebraram-se os 200 anos de seu nascimento.
Tal como nas obras de Dostô, há medo, desilusão, nervosismo, falta de ar e o entrever da canalhice humana.
Vivemos tempos incertos e dostoievisqueanos. E é nervoso esse riso que ri de nossos tempos.
Como todas as vezes em que li Dostô precisei de uma dose de Sêneca (pois nenhuma vodka seria suficiente para resolver essas coisas), desta vez, outra vez, corri para o meu amado Sêneca, mestre das minhas incertezas existenciais.
Façamos silêncio, com Sêneca. E vamos, até mesmo, parar de rir.
Sim, é difícil. Como avisa o filósofo, nenhum silêncio se conquista com luta, seja porque o universo é ruidoso, seja porque nós, humanos seres, tendemos a ser mais ruidosos até mesmo que o universo. Segundo Sêneca, o barulho está na nossa natureza mais profunda.
Sigamos seus conselhos e vamos, primeiramente, escutar o silêncio que habita a nossa profundidade. Silêncio não é não dizer, é ouvir o outro e ouvir em paz o barulho do mundo.
Em seguida, aprendamos a impor, sem nenhuma violência, o silêncio aos outros. Por mais que isso seja difícil na cidade de Belém, que se bate e se agita na pulsão natural do universo… Por mais que isso seja difícil no Brasil de Bolsonaro, que quer não escutar o outro e nem o universo…
Desistamos…
Somos seres contraditórios. Para nós, a literatura é por vezes silêncio; e, por vezes, ruído….
Boa semana a todxs.